Noman, Campos e Nunes, prefeitos de BH, Recife e São, Paulo, respectivamente. Fotos: Divulgação
Noman, Campos e Nunes, prefeitos de BH, Recife e São, Paulo, respectivamente. Fotos: Divulgação
eleições 2024

Querem se reeleger: o que prefeitos de BH, Recife e São Paulo fizeram pela população LGBTQIA+

Diadorim faz balanço das atuações de Fuad Noman, João Campos e Ricardo Nunes

As prefeituras desempenham um papel central na promoção e proteção dos direitos da população LGBTQIA+, sendo muitas vezes a linha de frente na implementação de políticas públicas e programas voltados para a diversidade e inclusão. Às vésperas das eleições municipais de 2024, a Diadorim analisou o trabalho de três prefeitos brasileiros que são candidatos à reeleição para entender como cada um tem abordado as questões LGBTQIA+ em suas respectivas cidades: Belo Horizonte, Recife e São Paulo.

Em Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD-BH) implementou algumas políticas voltadas para a população LGBTQIA+ durante sua gestão, incluindo a criação da Casa de Acolhimento LGBTI+, mas ganhou fama de ceder às pressões conservadoras após mandar tirar um adesivo de arco-íris da fachada de um equipamento público.

Recife, sob a liderança de João Campos (PSB-PE), avançou nas ações de inclusão, com destaque para a realização de eventos como os Jogos do Orgulho, mas o movimento LGBTQIA+ local ainda se queixa da centralização de recursos. 

Em São Paulo, a administração de Ricardo Nunes (MDB-SP) também trabalhou em algumas ações pró-LGBTQIA+, mas foi “tímida” e não ofereceu inovação. Além disso, o prefeito enfrenta críticas por ter se mantido ausente da última Parada do Orgulho da cidade, conhecida por ser a maior do mundo.

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Fuad Noman cedeu à pressão conservadora

Em 2020, Fuad Noman foi eleito vice-prefeito de Belo Horizonte, na chapa de Alexandre Kalil (PSD-BH), com uma votação expressiva: 1.109.634 votos, número que corresponde a 63,33% dos votos válidos. Após pouco mais de um ano de mandato, em março de 2022, Kalil pediu afastamento do cargo para concorrer ao governo de Minas Gerais, deixando Noman à frente da Prefeitura. 

De lá pra cá, houve aumento na verba destinada à pauta LGBTQIA+ pelo município. Os valores reservados para políticas de promoção, proteção e defesa dos direitos dessa população foram de R$ 1.926.504,00 em 2022 e R$ 2.475.548,00 em 2023, conforme previsto na LOA (Lei Orçamentária Anual). Em 2020, ainda na gestão de Kalil, foram R$ 996.011,00. Em 2021, R$ 1.041.767,00.

Agora, Noman tenta a reeleição e tem 14% das intenções de voto, conforme aponta o Datafolha. Mauro Tramonte (Republicanos) mantém a liderança com 29%. Bruno Engler (PL) e Duda Salabert (PDT) estão empatados com Noman, com 12% e 13%, respectivamente.

PRINCIPAIS AÇÕES E POLÍTICAS PRÓ-LGBTQIA+ DE BELO HORIZONTE


CASA DE ACOLHIMENTO LGBTI+

Em dezembro de 2022, a administração de Noman inaugurou a Casa de Acolhimento LGBTI+. De acordo com a Prefeitura de Belo Horizonte, ela é a primeira no Brasil a ser totalmente financiada pelo poder público e tem capacidade para abrigar 20 pessoas. Desde a inauguração em 2022 até maio de 2024, a casa recebeu um investimento total de R$ 1.561.071,50. Estão previstos investimentos de mais R$ 3,77 milhões até maio de 2029. “Este espaço é destinado a oferecer suporte e acolhimento específico para a população LGBTI+, representando um avanço significativo na garantia de direitos e proteção para esse grupo”, diz o órgão.

COMISSÃO MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DE PESSOAS LGBTI+

Em 2023, a Prefeitura de Belo Horizonte criou uma comissão para fomentar a participação social da população LGBTQIA+ na política municipal, composta por quarenta pessoas, entre titulares e suplentes, sendo 20 da sociedade civil e 20 representantes governamentais. O órgão tem caráter consultivo e deliberativo, com atribuições para acompanhar, avaliar e propor programas, projetos e ações sobre o tema.

FUNDO MUNICIPAL

O Fundo Municipal do Idoso financiou a pesquisa “Envelhecer LGBT+: Histórias de vida e direitos”, em parceria com o Núcleo Jurídico de Diversidade Sexual e de Gênero da Universidade Federal de Minas Gerais. “O relatório, publicado em livro em 2023, contribui para a compreensão das questões enfrentadas por essa população com o avanço da idade”, afirma a assessoria da Prefeitura de Belo Horizonte. A equipe investigou 114 pessoas, que responderam um questionário on-line, e realizou 75 entrevistas. No questionário, as informações buscadas foram o perfil socioeconômico, a raça, a orientação sexual e a identidade de gênero da pessoa. Também foi apurada a natureza das violências e discriminações vivenciadas ao longo da vida e o acesso à moradia e saúde. Já nas entrevistas, foram levantadas histórias sobre vivências familiares, comunitárias, profissionais, e como são afetadas pela sexualidade e pela identidade de gênero

 

EVENTOS E APOIOS

A prefeitura também patrocinou a primeira Parada Negra LGBT, realizada em maio de 2024, e aumentou o valor destinado à Parada LGBTQIA+ de Belo Horizonte, que recebeu R$ 350 mil em 2023 e R$ 670 mil em 2024. 

Ações insuficientes

Apesar dessas ações, a avaliação de Dalcira Ferrão, psicóloga e militante do Coletivo de Mulheres Bissexuais e Lésbicas Transexuais e Cisgêneras, de Minas Gerais, é de que a administração de Fuad Noman ainda está aquém das necessidades e expectativas do movimento LGBTQIA+ da capital mineira. 

Ela reconhece algumas iniciativas positivas, como a criação da Casa de Acolhimento LGBTI+ e o apoio à Parada do Orgulho LGBTI+, mas aponta que são insuficientes frente às necessidades reais dessa população, que carece de avanços em áreas como trabalho e renda, saúde integral e segurança pública. 

Além disso, Dalcira menciona a retirada do símbolo do movimento LGBTQIA+ da fachada do Centro de Referência LGBTI+ como um sinal preocupante de retrocesso. No começo do ano, Noman pediu para que um adesivo com as cores do arco-íris fosse arrancado da frente do prédio, cedendo à pressão de vereadores conservadores.

Tendo esse histórico em vista, a representante do Coletivo BIL avalia que a reeleição de Noman não é ideal, já que no passado, o atual prefeito não demonstrou ter uma postura firme em relação às demandas da comunidade LGBTQIA+. No entanto, ela ressalta que o cenário é delicado, pois seu principal adversário é ainda mais conservador. 

“A esperança é que quem quer que seja eleita(o) possa manter-se corajosa(o) e combativa(o) aos retrocessos colocados cotidianamente à população LGBTI+”, fala.

Popularidade de João Campos

João Campos foi eleito prefeito de Recife em 2020, com 346.035 votos, 32,87% dos votos válidos. Agora ele é candidato à reeleição e tem chances de ganhar em primeiro turno, de acordo com as pesquisas. O Datafolha aponta que ele tem 74% das intenções de voto, assumindo uma liderança confortável na disputa.

Desde que se tornou prefeito, Campos aumentou em 611% o orçamento para políticas LGBTQIA+. Em 2018, no final da gestão de Geraldo Julio (PSB), o valor destinado na LOA era de R$ 480 mil; em 2023 foi de R$ 3,4 milhões. Entre as políticas implementadas durante sua gestão estão:

PRINCIPAIS AÇÕES E POLÍTICAS PRÓ-LGBTQIA+ DO RECIFE


PROTOCOLO DE ATENDIMENTO

Em fevereiro de 2023, a Prefeitura de Recife lançou um protocolo para a formação de servidores públicos em questões de gênero e diversidade sexual. “Essa iniciativa visa melhorar o atendimento e a abordagem da população LGBTQIA+ por parte dos agentes municipais”, explica a gestão.


GUIA DIGITAL PARA TURISTAS LGBTQIA+

Em agosto de 2021, Recife lançou um guia turístico virtual com 33 opções de serviços e estabelecimentos acolhedores para turistas LGBTQIA+. Esta foi uma ação promovida pela Secretaria de Turismo e Lazer visando fomentar o turismo inclusivo na cidade.

 

JOGOS DO ORGULHO DO RECIFE

Desde outubro de 2021, a Secretaria Executiva de Juventude realiza anualmente os Jogos do Orgulho. O evento, que teve sua quarta edição em junho de 2024, promove a inclusão ativa de jovens LGBTQIA+ nas práticas esportivas, exigindo que pelo menos 50% dos participantes sejam desse grupo.

 

FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA TRANS E TRAVESTIS 

Em setembro de 2023, a prefeitura lançou um edital para selecionar projetos voltados para a formação profissional e a empregabilidade de pessoas trans e travestis, buscando fortalecer a inclusão no mercado de trabalho.

 

AMPLIAÇÃO DO AMBULATÓRIO LGBTQIA+ 

“Foram ampliadas as equipes técnicas dos ambulatórios especializados, como o Ambulatório LGBT Patrícia Gomes e o Ambulatório LBT do Hospital da Mulher, para atender melhor às necessidades dessa população”, afirma o órgão.


APOIO ÀS PARADAS

A gestão de Campos informa que tem apoiado anualmente as paradas da diversidade, oferecendo infraestrutura, atrações artísticas e suporte logístico. 

Investimento insuficiente

Lucas Lira, advogado e ativista de direitos humanos que vive no Recife e preside o Conselho Estadual dos Direitos da População LGBTQIAPN+ de Pernambuco, reconhece que a gestão de Campos tem avançado, destacando a criação da Casa de Acolhimento LGBTQIA+ Roberta Nascimento e espaços de diálogo como o Conselho Municipal.

No entanto, ele aponta que a centralização e a limitação de recursos são problemas significativos. Na visão do ativista, o investimento na pauta ainda é insuficiente para enfrentar a crescente onda de LGBTfobia e para alcançar todas as áreas da cidade, especialmente as periféricas.

Segundo Lira, iniciativas como a criação de um Plano Municipal e uma Secretaria Executiva específica para diversidade são necessárias para garantir uma melhor distribuição de recursos.

O ativista avalia que Campos é um candidato forte à reeleição, e atribui parte da popularidade do prefeito a ter feito uma gestão inclusiva, mas ressalta que a continuidade e o aprimoramento das políticas são essenciais para manter e expandir os ganhos já alcançados. 

Em outra reportagem publicada pela Diadorim, Lira e Chopelly Santos, presidente da Amotrans (Articulação e Movimento para Travestis e Transexuais de Pernambuco), também se queixaram da ausência do prefeito em eventos LGBTQIA+, demandando maior apoio público à pauta. 

Nunes ignorou a maior Parada do Orgulho do mundo 

Ricardo Nunes (MDB-SP) assumiu a Prefeitura de São Paulo em 2021, após a morte de Bruno Covas (PSDB-SP), de quem era vice. A chapa venceu as eleições municipais de 2020 com 1.295.218 votos. Agora é candidato à reeleição e, de acordo com a primeira pesquisa Datafolha realizada após o início do horário eleitoral, tem 22% das intenções de voto. Empatados, Guilherme Boulos (PSOL-SP) tem 23% e Pablo Marçal (PRTB-SP) tem 22%. 

A Diadorim entrou em contato com a Prefeitura de São Paulo solicitando informações sobre as ações implementadas durante a gestão de Nunes, mas não recebeu resposta até a publicação deste texto. Estas foram as iniciativas mapeadas pela reportagem:

PRINCIPAIS AÇÕES E POLÍTICAS PRÓ-LGBTQIA+ DE SÃO PAULO


COORDENADORIA DE POLÍTICAS LGBTQIA+

Em 2021, foi criada a Coordenadoria de Políticas LGBTQIA+ dentro da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania. Este órgão é responsável por coordenar e implementar políticas voltadas para a comunidade LGBTQIA+.

CENTRO DE REFERÊNCIA 

Desde 2022, o centro oferece serviços especializados de apoio psicológico, jurídico e social para enfrentar desafios como discriminação e violência contra LGBTs.

APOIO À PARADA  

A administração municipal apoiou a realização da Parada do Orgulho LGBTQIA+ em 2024, com R$ 4 milhões. No entanto, o prefeito não esteve presente. 

Administração ‘tímida’

Lucas Bulgarelli, diretor executivo do Instituto Matizes, destaca que, embora a gestão de Nunes tenha mantido e ampliado alguns serviços importantes para a população LGBTQIA+ de São Paulo, como o Centro de Referência e Cidadania, não houve inovações significativas. 

Ele também enfatiza a ausência de Nunes na última Parada do Orgulho de São Paulo. “Foi um sinal claro de falta de comprometimento. Enquanto outros candidatos participaram, Nunes estava em um evento religioso no mesmo final de semana.”

É por isso que, para o representante do Matizes, a reeleição de Nunes não seria positiva para os avançar na pauta. “A falta de propostas novas e a abordagem tímida em relação às questões LGBTQIA+ levantam dúvidas sobre o seu comprometimento com a comunidade”, resume.

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