Propaganda foi retirada do entorno do colégio XV de Novembro. Foto: Diversiclube
cultura

Outdoors de cineclube LGBTI+ são retirados da frente de escola religiosa em Garanhuns (PE)

Reportagem produzida e publicada originalmente por Marco Zero Conteúdo

Era um outdoor sem polêmicas. Em letras grandes, coloridas, estava escrito “Diversiclube – foi um sucesso!”. Abaixo, enumerava as conquistas do cineclube da diversidade em 2022: “cultura; acessibilidade; respeito, inclusão e diversidade; emprego e renda para Garanhuns”. A propaganda do Diversiclube, um cineclube que exibe filmes com temática LGBTI+, custou R$ 1,2 mil, por cada outdoor. Foram colocados dois na cidade do Agreste Meridional de Pernambuco, pagos com dinheiro público, já que o cineclube foi aprovado pelo Funcultura, do Governo do Estado, pois esse valor já estava previsto no projeto para o pagamento de dois outdoors.

A propaganda foi colocada na quarta-feira da semana passada, dia 29 de junho. Deveria passar duas semanas em exibição, mas na segunda-feira passada, 4 de julho, os responsáveis pelo cineclube foram surpreendidos com os outdoors arrancados.

O idealizador do cineclube, Joesile Cordeiro, não tem dúvidas: a retirada foi por homofobia. Ele alerta que os dois outdoors retirados ficavam na frente e atrás do Colégio Presbiteriano XV de Novembro, instituição cristã de ensino tradicional em Garanhuns. Em 2020, o colégio virou notícia nacional após alunos denunciarem a questão de uma prova. O enunciado pedia que os alunos escrevessem uma resposta “sem que que os mesmos sejam taxados de preconceituosos, mas que que a resposta seja firme quanto aos princípios bíblicos”. A pergunta era “sua amiga te chamou em particular e te confessou que se sente atraída por outra menina, o que você diria e como apontaria os textos bíblicos neste diálogo?”.

Com a polêmica, a escola emitiu uma carta aberta em que afirmava que “ensinamos a nossos estudantes que visões distintas são possíveis de coexistirem no âmbito de nossos relacionamentos e que precisamos saber lidar com elas”.

É no XV de Novembro também que acontece, há anos, um festival de música gospel durante o Festival de Inverno de Garanhuns (FIG). Neste ano, o festival do colégio foi absorvido pelo FIG: é a prefeitura quem vai pagar o cachê dos artistas evangélicos no dez dias de festival, além da estrutura de som, palco e iluminação. Antes, era o próprio colégio e as igrejas que arcavam com os custos.

Não há dúvidas, portanto, de que se trata de um colégio influente. Causou estranheza para o cineclube quando a Stampa, empresa responsável pelos outdoors, entrou em contato com o Diversiclube e afirmou que os outdoors foram retirados porque não poderiam mais ficar ali. À Marco Zero, a representante da Stampa em Caruaru, que atende também Garanhuns, afirmou que o que aconteceu não tem “nada a ver com homofobia” e que não foi um pedido do colégio a retirada dos outdoors. Afirmou que os espaços já haviam sido vendidos para outra empresa e foi um erro a colocação deles ali. Quando perguntada se foi a própria Stampa que fez a retirada da propaganda, disse apenas que a retirada foi “autorizada” pela Stampa.

Layout do outdoor retirado sem da frente do Colégio XV de Novembro. Foto: Divulgação/Diversiclube

Para Joesile, tudo não passa de uma estratégia. “É uma fala paliativa, para que não ocorra nenhuma tensão entre a empresa e a escola. No fim das contas, recebemos a ligação de que fomos proibidos de comprar os espaços que ficam no circuito da escola. São seis outdoors que ficam no terreno do colégio, na frente e atrás dele. Então já é estranho. Afirmam que o espaço (onde estavam os dois outdoors do projeto) já haviam sido vendidos, mas eles continuam lá sem publicidade alguma. Como trabalham por quinzena, só deve entrar outro ali quando passar essa semana, que era nossa”, diz.

O cineclube Diversiclube contou com oito sessões, no Sesc de Garanhuns, de novembro do ano passado até junho. Exibiu filmes como “Recife é um ovo, de Gus Arruda Lins, e o videoclipe “Lamento de força travesti”, de Renna. Contava também com debates e performances. Teve algumas sessões com ingressos esgotados. “O projeto foi tão grande que repercutiu fora da cinema, foi um evento de fortalecimento muito bacana. A cada sessão tentamos trabalhar uma letra da sigla [do LGBTQIA+], trazer novas narrativas para debater no contexto da cidade, se reunir e se pautar, debater com pessoas também de fora da comunidade, para sair do preconceito e ir para o respeito”, explica Joesile.

Apesar de não poder mais ocupar os seis pontos perto da escola, que fica em uma área central da cidade, em frente à fonte luminosa, o Diversiclube ainda manteve a compra dos espaços. O cineclube terá sua propaganda exposta em dois locais, um deles na Avenida Rui Barbosa, próximo, mas nem tanto, da escola. “Quem vive na cidade sente mais fortemente, seja de forma micro ou macro, a homofobia. Mas também somos uma comunidade gigante, uma comunidade que tem demanda para esse tipo de projeto. Precisamos ir contra essa narrativa hegemônica e resistir, lutar. Por isso, vamos continuar com a publicidade, mesmo que seja em outros locais. Para mostrar que estamos aqui e que vamos seguir com nosso trabalho”, afirme Joesile.

A Marco Zero tentou entrar em contato com o colégio XV de Novembro por telefone, e-mail e Whatsappp, mas não obteve resposta.

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