Retrocesso e sucateamento: a política LGBTI+ do governo Bolsonaro
Presidente acabou com políticas públicas; índices de violência cresceram
Na reta final do governo Bolsonaro, o presidente, que tenta reeleição, enfrenta forte rejeição entre eleitores LGBTI+. Em uma pesquisa Datafolha de setembro, o segmento dos homossexuais e bissexuais foi o que apresentou a maior desvantagem do mandatário em relação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 57 pontos percentuais.
Conhecido por seu histórico de declarações LGBTIfóbicas, Bolsonaro atuou para descontinuar políticas públicas e diminuir a participação da comunidade em sua gestão. Os índices de violência contra essa população também cresceram, diferentemente do que o presidente vem dizendo nas últimas semanas.
Veja o balanço das ações do governo Bolsonaro para a população LGBTI+:
Homicídios aumentaram
Ao contrário do que afirmou Bolsonaro em entrevista ao SBT no sábado (22), os índices oficiais de violência contra a população LGBTI+ cresceram ao longo de sua gestão. Em 2018, último ano da gestão de Michel Temer (MDB), foram registrados 124 assassinatos de pessoas LGBTI+. Esse número recuou para 97 em 2019, mas voltou a subir para 167 em 2020, atingindo 179 em 2021.
Os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que compila as informações oficiais dos estados.
Outros índices de violência também registraram aumento no período, segundo o Anuário. Os de lesões corporais praticadas contra pessoas LGBTI+ saltaram de 542 em 2018 para 1.719 no ano passado. No mesmo período, os casos de estupro passaram de 41 para 179.
Por outro lado, o relatório do Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+ aponta uma redução do número de mortes violentas dessa população ao longo da gestão Bolsonaro, caindo de 420 em 2018 para 316 em 2021.
Vale ressaltar, contudo, que esse levantamento utiliza uma outra metodologia, de monitoramento de casos registrados em notícias, que pode não representar todo o fenômeno. Além disso, o número de assassinatos registrado em 2021 caiu em relação a 2017 e 2018, mas está em um patamar semelhante ao registrado entre 2012 e 2016, durante a gestão Dilma Rousseff (PT).
Extinção de órgão federal
Mantido ao longo dos três primeiros anos de governo Bolsonaro, o Departamento de Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (DPLGBT) foi extinto por meio do Decreto nº 10.883, de 6 de dezembro de 2021. O órgão era responsável por coordenar ações voltadas a essa população no âmbito do governo federal e estava vinculado ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, então comandado por Damares Alves.
Criado em 2009, durante o governo Lula, como coordenadoria, o órgão foi alçado ao status de diretoria na gestão Temer, em 2017. Desde a extinção do departamento, a temática LGBTI+ está a cargo da Secretaria Nacional de Proteção Global, também responsável pela população em situação de rua.
Menos financiamento
O governo Bolsonaro também deixou de prever recursos no Orçamento Federal destinados especificamente a ações ligadas à população LGBTI+. A última Lei Orçamentária Anual (LOA) aprovada no governo Temer, em 2018, destinada ao ano de 2019, havia retomado uma ação orçamentária exclusiva para políticas LGBTI+ suspensa em 2016.
Desde 2020, no entanto, as LOAs voltaram a não ter essa previsão de recursos. Ações direcionadas a essa população podem ser desenvolvidas e financiadas com outras rubricas. Contudo, a inexistência de recursos exclusivos implica dificuldades maiores de financiamento, já que essas políticas precisam disputar verba com outras atividades, apontam especialistas.
Menos participação
Em abril de 2019, Bolsonaro editou um decreto extinguindo centenas de órgãos de participação da sociedade civil ligados à administração pública federal. Entre eles estava o Conselho Nacional de Combate à Discriminação, criado em 2001 por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e que a partir de 2010, no governo Lula, passou a ter foco específico na população LGBTI+.
Entre as atribuições do Conselho estavam monitorar ações e o cumprimento de metas, propor a realização de estudos e encaminhar denúncias. O grupo era composto por 15 integrantes do governo federal e 15 representantes da sociedade civil indicados por entidades e selecionados por processo seletivo público.
Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu parcialmente o decreto de Bolsonaro, impedindo a extinção dos conselhos federais criados por lei. Dessa forma, o mandatário editou um novo decreto, retomando o caráter gerérico do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, que deixou de mencionar a população LGBTI+ como público-alvo.
Bolsonaro também revogou a convocação para a 4ª Conferência Nacional de Políticas Públicas de Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, que seria realizada em novembro de 2019. A iniciativa havia sido publicada em 2018 por Temer.
O objetivo era reunir mil delegados para avaliar, implementar e propor políticas públicas no âmbito do governo federal voltadas a essa população. A primeira edição foi realizada em 2008, durante o governo Lula, e foi seguida por conferências promovidas em 2011 e 2016, na gestão Dilma.