O presidente Jair Bolsonaro no desfile cívico-militar do 7 de Setembro. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
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‘Imbrochável’: o patético falocentrismo de Bolsonaro no 7 de Setembro

Durante discurso no 7 de Setembro, presidente fez declarações machistas e gritou que é ‘imbrochável’

A cena é patética. Diante de uma multidão para celebrar os 200 anos da Independência do Brasil, no 7 de Setembro em Brasília, o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição, incrementou o discurso antidemocrático com mais uma de suas declarações machistas.

A essa altura, todo mundo já viu em vídeo, mas relembro: “Não há o que discutir, uma mulher de Deus, família e ativa na minha vida, não é ao meu lado não, muitas vezes ela está é na minha frente”, disse, se referindo à primeira-dama Michelle. “Tenho falado para os homens solteiros, para os solteiros que estão cansados de serem infelizes, procurem uma mulher, uma princesa, se case com ela para serem mais felizes ainda”, continuou o presidente, emendando com gritos de “Imbrochável, imbrochável, imbrochável”.

O horror é vexatório. Ocorre que temos como chefe de Estado do Brasil um falocrata, cujo discurso invariavelmente destila falas machistas e misóginas como a de hoje.

Forjada por elites econômicas, grupos neopentecostais e outras forças que extrapolam os limites do Brasil, a falocracia bolsonarista tornou-se um reflexo da onda conservadora contemporânea no país — fragilizado pela recessão econômica e escândalos de corrupção —, que voltou a solapar direitos humanos e civis e impor determinadas condutas de comportamento, reanimando discussões sobre opressão, tortura e viriarcado.

Bolsonaro chegou ao poder em um tempo de disputas entre os sujeitos sociais, principalmente aquela que despertou nos grupos conservadores o “pânico moral” – inconformados com o fortalecimento da insurgência de lutas pela emancipação feminina e por direitos de grupos historicamente minorizados.

Tais avanços sociais e políticos desencadearam no país uma crise, reverberada em todas as esferas do Estado e da sociedade civil, de tal modo que a mesma retórica-base da sustentação da ditadura de 1964 — de incisiva defesa da família, dos bons costumes e dos valores cristãos — retornou ao discurso geral, em uma cruzada contra grupos e avanços que, por essa ótica, ameaçam a ordem moral e sexual então vigente.

Neste 7 de Setembro de 2022, Bolsonaro, o falocêntrico, como de costume cercado por homens, recorre ao seu próprio pênis para proclamar ou se autoconvencer de sua virilidade. Vivemos, como diz o escritor João Silvério Trevisan, o mais perfeito exemplo da sindemia da masculinidade tóxica à égide do ex-capitão.

O problema é que essa epidemia nos destrói. Duzentos anos depois da Independência, mais de 30 milhões de brasileiros passam fome, mais de 600 mil cidadãos morreram vítimas de Covid-19 – afetados, principalmente, pela má gestão do governo – e quase 10 milhões de pessoas estão desempregadas. Enquanto isso, isolado e desaprovado, Bolsonaro recorre ao ego para se manter.

É sempre ao falocentrismo que recorrem os homens acuados. Previsível, então, que a frustração acentue ainda mais a neurose desse Édipo freudiano, ao ponto do papelão desta quarta-feira. Ele só esquece que suas questões não se resolvem no Alvorada, mas um terço delas, provavelmente, teriam respostas no divã.

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Mateus Araújo

Jornalista pela Universidade Católica de Pernambuco e mestre em Artes pela Unesp, pesquisa masculinidades no teatro. É repórter do TAB UOL. Já escreveu para revista Continente, Folha de S.Paulo e integrou a editoria de Cultura do Jornal do Commercio. Foi cofundador da Diadorim.

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